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Posts do blog (96)

  • Marxismo e Filosofia da Linguagem: convidando Bakhtin para um diálogo

    Pretendo, por meio da escritura de alguns artigos a serem publicados aqui mesmo no Portal do Costão, trazer Bakhtin para um diálogo . Faço etse convite por uma razão muito simples: Mikhail Bakhtin e o assim chamado Círculo de Bakhtin  tiveram uma contribuição significativa para a fundamentação teórica da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), especialmente no que diz respeito à concepção de linguagem e ao trabalho com gêneros discursivos no ensino de língua portuguesa. A BNCC adota uma perspectiva dialógica da linguagem, alinhada com os pressupostos teóricos de Bakhtin e de seu Círculo . Interação, Dialogismo e Enunciado, por exemplo , três conceitos-chave da Teoria Dialógica da Linguagem,  presentes neste importante documento da Educação brasileira, fundamentam a proposta da Base Nacional de um ensino de língua voltado para a reflexão sobre os usos da linguagem e para uma aprendizagem construtiva e colaborativa, primando, assim, para a formação de indivíduos capazes de interagir de maneira crítica em diferentes áreas da vida humana. Por meio desses e de outros referenciais teóricos, a BNCC busca assim promover o desenvolvimento da competência discursiva dos alunos, capacitando-os e os convidando a participar efetivamente das práticas sociais mediadas pela linguagem. Se quisermos aprimorar nossa prática laboral em sala de aula e avançar nos estudos da linguagem, de seus códigos e de suas tecnologias, é de fundamental importância melhormente conhecê-los. A eles – a esses três conceitos-chave mencionados acima -, no entanto, voltaremos a falar em um outro momento, para que possamos adotar uma abordagem mais pontual e esclarecedora. Por hora, é suficiente compreendermos que a visão bakhtiniana de interação  considera a linguagem como um evento social e interativo presente nas relações entre os indivíduos; enquanto o conceito de dialogismo indica que todo discurso é influenciado por vozes sociais que estabelecem diálogos com outros discursos e a noção de enunciado , por sua vez, traz-nos a ideia de uma unidade concreta da comunicação verbal que se destaca pela alternância dos sujeitos falantes. O primeiro texto que trago para dialogar com Bakhtin é "Marxismo e Filosdofia da Linguagem", livro publicado no Brasil pela Editora Hucite, um dos mais importantes de sua singular produção intelectual. Esta obra é bastante referenciada e citada sobretudo pelos intelectuais ligados à Educação brasileira por ela dedicar especialmente atenção à compreensão da linguagem como uma aparência social e ideológica. Publicado originalmente em 1929 sob o pseudônimo de Volóchinov, a obra explora a relação entre linguagem, sociedade e ideologia, propondo uma análise crítica que se distancia das abordagens linguísticas tradicionais. Neste artigo que ora escrevo em especial, dedicar-nos-emos à compreensão e a explicitação das ideias presentes no segundo capítulo do livro com a intensão de torná-lo mais facilmente compreensivo para aquele leitor interessado em assuntos relativos à linguagem ao ensino da língua portuguesa a partir dos pressupostos da BNCC. A nossa intenção, neste primeiro momento, é dar a conhecê-lo, comunicar a sua existência enquanto reflexão intelectual bastante referendada pelos pensadores da nossa Educação para que, assim fazendo, melhormente compreendermos o que exige a Base Nacional  acerca de nossa prática educacional em sala de aula. Trata-se, pois, de estudo didático e reflexivo sobre aquilo que o próprio autor nos deixou escrito. Sigamos para o texto. O capítulo a que nos referimos acima intitula-se "Relação entre as Infraestruturas e as Superestruturas". Nele, Bakhtin aborda a interdependência entre a base econômica de uma sociedade e suas expressões culturais e ideológicas. Para melhor entendimento do que trata este capítulo, torna-se fundamental compreendermos os conceitos de infra e superestrutura a partir da do pensamento maximiniano. Para Marx, a infraestrutura refere-se ao conjunto das forças produtivas e das relações de produção em um dado momento histórico. É a base econômica que determina  as condições materiais de existência e as relações sociais de uma sociedade. No contexto do marxismo, os conceitos de infraestrutura e superestrutura são fundamentais para se entender a dinâmica das relações sociais e econômicas. A infraestrutura , em particular, refere-se à base econômica de uma sociedade, que inclui as forças produtivas, as relações de produção e as condições materiais que sustentam a economia. Para Karl Marx, a infraestrutura é composta, entre outros elementos, pelos meios de produção (ferramentas, máquinas e instalações utilizadas na produção de bens), pelas relações sociais de produção , que se estabelecem entre os indivíduos no processo de produção, a exemplo das interações trabalhistas entre patrões e trabalhadores, e pelas forças produtivas , que combinam o trabalho humano e os recursos naturais com fins de otimizar a produção material. Todos esses elementos infraestruturais formam a base sobre a qual se ergue a superestrutura, influenciando diretamente as condições de vida e as relações sociais. A superestrutura , por sua vez, é composta pelas instituições sociais, políticas e culturais que emergem da infraestrutura. Nela, estão presentes o Estado, representado por suas instituições políticas (governo, leis e sistemas jurídicos), a cultura (religião, filosofia, arte e outras formas de expressão cultural) e a ideologia (ideias e valores que justificam e sustentam a ordem social existente). A superestrutura é vista como uma projeção da infraestrutura , refletindo e reforçando as relações de poder e dominação existentes. Marx argumenta que a superestrutura serve para legitimar e perpetuar a dominação da classe dominante sobre a classe trabalhadora. A superestrutura é, para utilizarmos uma linguagem figurada, o Olimpo e os seus deuses. Particularmente, a relação entre infraestrutura e superestrutura é frequentemente descrita em Mark como unidirecional, estabelecendo, por assim dizer, uma relação causal ou linear em que os elementos presentes na infraestrutura determinam a existência mesma da superestrutura . No entanto, algumas interpretações modernas do marxismo, como a feita aqui por Bakhtin, reconhecem que essa relação pode ser mais complexa, permitindo que a superestrutura também influencie a infraestrutura . Isso implica que mudanças nas ideias e nas instituições culturais podem, em certos contextos, afetar as condições econômicas e sociais. Todos esses esclarecimentos preliminares são cruciais para a análise marxista da sociedade, pois ajudam a entender como as condições materiais e as relações sociais moldam as ideologias e as instituições que governam a vida social. Essas considerações iniciais também são importantes para entendermos a obra de pensadores como Mikhail Bakhtin (e Voloshinov) que, de igual forma, contribui para essa discussão, explorando como a linguagem e a comunicação desempenham papéis significativos na formação da ideologia e na interação entre esses dois domínios. Dito isso, fica fácil percebermos que a superestrutura tem por função a manutenção da ordem social, uma vez que atua para legitimar e perpetuar as relações de produção existentes, servindo aos interesses da classe dominante, qualquer que seja ela. Em última instância, ela possibilita que a classe dominante, por meio do discurso ideológico, dissemine suas ideias, moldando a consciência social e estabelecendo normas que sustentam sua posição de poder. Assim, a relação entre infraestrutura e superestrutura , no marxismo ortodoxo, é marcada por um determinismo unidirecional em que a infraestrutura é vista como determinante da superestrutura , ou seja, as condições econômicas moldam as instituições e ideologias sociais. Bakhtin, singularmente, rediscute a perspectiva maximiniana ao afirmar que há uma interdependência entre elas. A relação não é estritamente unidirecional. A superestrutura também pode influenciar a infraestrutura criando um ciclo de feedback no qual as ideias e instituições sociais podem, em determinados contextos, afetar as condições econômicas. Ele enfatiza a complexidade da relação entre infraestrutura e superestrutura , sugerindo que a análise marxista deve considerar tanto a influência da base econômica sobre a cultura quanto o papel que as ideias e instituições podem desempenhar na transformação das condições materiais. Essa perspectiva amplia a compreensão das dinâmicas sociais e culturais, reconhecendo a interação entre fatores econômicos e ideológicos. Ao agir assim, em síntese, enfatiza a interdependência entre esses dois conceitos, desafiando a visão determinista tradicional do marxismo em uma perspectiva bidirecional. Os principais pontos sobre essa relação bidirecional são: Interdependência: Bakhtin argumenta, conforme mencionamos acima, que a infraestrutura (base econômica) não apenas determina a superestrutura (cultura, ideologia, instituições), mas que a superestrutura também pode influenciar a infraestrutura. Essa visão contrasta com a interpretação marxista ortodoxa, que tende a ver a relação como unidirecional. Reflexão e Refração: Ele utiliza os conceitos de "reflexão" e "refração" para descrever como a realidade (infraestrutura) se reflete na linguagem e nas ideologias (superestrutura) e, ao mesmo tempo, como essas ideologias podem refratar ou reinterpretar a realidade, influenciando as relações sociais e econômicas. A refração do signo linguístico em Bakhtin refere-se à capacidade dos signos de refletir e ressignificar realidades ideológicas em contextos sociais diversos. Bakhtin argumenta que os signos não são neutros ou univalentes; pelo contrário, eles são produtos de interações sociais e históricas, refletindo as condições materiais e ideológicas em que são utilizados. Isso implica que, ao serem enunciados, os signos carregam uma carga ideológica que se transforma com o tempo e o contexto, evidenciando a natureza dialética da linguagem. Cada uso de um signo pode trazer novas interpretações e significados, dependendo das relações sociais e das ideologias em jogo. Desta forma, a linguagem se torna um espaço de luta entre diferentes significados e valores, onde a individualidade e a coletividade se entrelaçam. Para ilustramos, de maneira didática, o que foi dito acima, apresentamos a seguir dois exemplos: Primeiramente, tomemos por base obras de arte literária, como as de Dostoiévski, de cuja leitura Bakhtin observa como as personagens dialogam entre si, refletindo e refratando suas realidades pessoais e sociais. Cada voz no diálogo traz uma nova perspectiva, alterando a compreensão do leitor sobre a situação. Nesses diálogos, os signos não apenas refletem a realidade, mas também a distorcem e a reinterpretam, em estreita relação com o contexto social e histórico no qual estão imersos. Em um segundo momento, imaginemos uma cena cotidiana, quando uma pessoa compartilha uma experiência: sua narrativa reflete não apenas os eventos, mas também sua interpretação pessoal, influenciada por suas emoções e contexto social. Essa narrativa, ao ser ouvida por outra pessoa, pode ser refratada, gerando novas interpretações e significados. Encerramos aqui este primeiro diálogo com Bakhtin. Queremos você no próximo bate-papo. Até lá. Prof. Heriberto de Souza.

  • III Costão Rock Festival

    No do dia 15 de julho de 2022, uma sexta-feira, com o intuito de celebrar o Dia Mundial do Rock (13 de julho), no intervalo após o almoço estudantil e antes do retorno às aulas do período da tarde, sem prévio ensaio ou seleção antecipada de repertório, o professor Jonas Dantas (biologia) subiu ao palco fixo do Costão, plantado no pátio interno do escola, e começou a performar clássicos do metal  e do rock pop  brasileiro: um show musical improvisado acabara de acontecer. A adesão dos alunos à performance foi imediata, com participação efeitva de muitos deles tanto no palco quanto na plateia. Alguns estudantes, músicos incipientes, também começaram a tocar e a cantar suas músicas preferidas: surgia, assim, de forma inusitada e embrionária, o Costão Rock Festival  que, neste ano, já se apresenta em sua terceira edição. O Rock and Roll é um gênero musical que emergiu nos EUA em 1950 e se disseminou globalmente. Caracterizado por batidas fortes, guitarras elétricas distorcidas e letras sobre rebeldia juvenil, o rock and roll sempre foi visto como um estilo musical rebelde e frequentemente enfrentou discriminação, apesar de seu impacto duradouro na excelência cultura global. No ano seguinte, em 2023, o professor Claudemir Ferreira (biologia) consolidou o movimento inicial ao sugerir aos professores músicos do Costão a realização de um Festival de Rock na escola nas proximidades da data oficial mundialmente celebrada. Para consolidar essa ideia, formaram a Cátedra (Jonas Dantas, guitarra e voz, Claudemir Ferreira, guitarra, Ebis Dias, contrabaixo, e Jack Leão, bateria). Com apenas um único ensaio, referendando àquela performance iniciada no ano anterior, apresentaram o segundo show de rock do Costão, consolidando o festival de rock no calendário oficial de eventos artístico-cultural da escola. Nesta edição de 2024, além de contar com um número maior de apresentações, o Costão Rock Festival passou a ter um caráter também social: uma doação de 1kg de alimento não perecível por pessoa será doada à instituição de caridade Almir do Picolé. De acordo com o seu idealizador, Jonas Dantas, a tendencia é que este festival de rock se transforme em um grande evento musical estadual, com a participação de várias escolas e municípios sergipanos. Esperamos que esta ideia seja acolhida não somente pela direção escolar, mas também pelo poder público estadual, por intermédio da Secretaria de Estado da Educação para que possamos, de fato, contar com a realização de um grande festival de rock estudantil genuinamente sergipano. Confiram, clicando no link, o ábum de fotos do II Festival de Rock do Costão , edição 2023: https://www.show-de-rock-2023.cepjoaocosta.org/ Programação oficial do III Festival de Rock do Costão: 13h às 14h - The JAM (variedades do rock) 14h30 às 15h30 - Cátedra (rock cacional) 16h às 17h - Windowside (clássicos do rock) 17h30 às 18h30 - The Nicks (Paramore cover e clássicos do Rock) 19h às 20h - Newrox (Charlie Brown Jr cover e outros)

  • Adeus, minha pequena! (Parte I)

    É mesmo mágico quando, de maneira premeditada, por meio da pesquisa motivada ou mesmo de maneira inesperada, deparamo-nos com vestígios do nosso passado que nos permitem, mesmo parcialmente, enxergar o cotidiano daqueles que viveram antes de nós. Quando isso ocorre, é possível ainda, contando sempre com o auxílio luxuoso, em parte, da imaginação, compreender tanto os sentidos do nosso agorinha, quanto a razão de nossos diversos hábitos e das multiformes realidades culturais de nossos dias. São esses homens e mulheres de ontem, por assim dizer, que se nos apresentam como nossos antepassados mais diretos, compondo, de certa forma, em mosaico, a gênese de nossa história. E como não poderia ser diferente, embora tenham vividos décadas, séculos antes, carregam consigo semelhantes sentimentos, comuns a todos nós, de padecer pelas angústias de seu presente e de sofrer pelas incertezas de seu porvir. O texto que se segue é um comentário pontual, um tanto imaginativo, acerca de uma publicação feita por um repórter quase anônimo publicada em um jornal são-cristovense dois dias depois do surgimento da nova capital de Sergipe. Digo “repórter quase anônimo” porque nosso escritor se subscreve com um brevíssimo Justus, desacompanhado de seu sobrenome. Na verdade, trata-se de um “comunicado”, conforme mesmo escreveu seu autor, informando o leitor sobre a transferência da Capital da Provínica , da antiga São Cristóvão para a nova Aracaju. Certamente, quando foi escrito, Aracaju ainda não existia. O morador de São Cristóvão - deixa entrever o Justus em seu artigo - está perplexo, um tanto quanto angustiado e dividido diante da iminente perda do status de sua cidade como Capital da Província de Sergipe. Por este se tratar de um escrito longo, cuidarei de, se necessário, subdividi-lo em partes, para maior conforto do leitor, e, em momento oportuno, publicá-lo-ei em data diversa. Era uma quarta-feira, 19 de março de 1855 , dois dias após ser decretada oficialmente a cidade de Aracaju como a nova capital de Sergipe, em sua edição n.º 21, o “Correio Sergipense: (Folha Official, Politica e literária)”, impresso na “Tipografia Provincial”, com sede ainda em São Cristóvão, já antiga Capital da Província, publica o seguinte: COMUNICADO[ 1 ] Mudança da Capital. Eis um movimento que hoje ocupa seriamente a geral atenção na província! Grave sensação sem dúvida deverá ele produzir e tem produzido! Deploram-no uns e outros o aplaudem! Todos têm razão! Parecerá absurdo tal dizê-lo, mas é verdade. Provemo-lo. [1] Trecho transcrito do original contendo, em sua ortografia e em sua estrutura sintática, certa mudança para o português atual com fins de melhor compreensão. Lamentam-se os habitantes da Capital que se deixa, por se lhes figurar, de presente, uma perda total e irreparável de nossa cidade, de suas fortunas, e isso tem razão. Folgam os que esposaram a ideia, porque visam de presente um horizonte de prosperidade para a província, e lá um ponto claro que lhe assoma o dia refulgente de seu brilhante futuro; e nisso também lhes vai a razão. Esse futuro abençoará ou amaldiçoará o pensamento. Cremos que a benção do Senhor e não a sua maldição completará a glória do homem inspirado para a realização desse pensamento. Não deixaremos, porém, de analisar os argumentos dos que choram. São eles: Perda dos edifícios públicos! Ruína do comércio! Miséria da população! Desabrigo na nova Capital! Observe o leitor que, de início, para o nosso repórter, tantos os que se posicionam a favor quantos os que se mostram contra à transferência da Capital têm suas razões; no decurso de seu artigo, no entanto, ele tentará, cuidando de ser imparcial, não tomar partido nem de um nem de outro posicionamento em relação à mudança da capital. “Parecerá absurdo tal dizê-lo" (que todos têm razão) - adverte ele -, "mas é verdade”; e como que desejoso de provar o que acabara de dizer, ao longo de seu Comunicado, apresenta, analisa e refuta quatro argumentos. Entretanto, no parágrafo seguinte, ao iniciá-lo escrevendo “Cremos que a benção do Senhor e não a sua maldição completará a glória do homem inspirado para a realização desse pensamento.”, deixa entrever, a um só tempo, sua opinião acerca deste assunto e sua simpatia por Ignácio Barbosa , um “homem inspirado para a realização desse pensamento”. É de conhecimento da maioria, sobretudo dos sergipanos, que Ignácio Barbosa é o fundador da cidade de Aracaju. Sigamos com a leitura... Bem. Quais os edifícios públicos a perder-se? O palácio do governo no valor máximo de 50.000$000! A casa do mercado no de 26:000$! A cadeia no valor de 25:000$000! O quartel no de 12:000$000! A casa da Tipografia no de 2:000$000! O armazém de artigos bélicos na de 3:000$000! Total 118:000$000! De acordo com Carlos Eduardo Francisco Sampaio , professor de matemática do Centro de Excelência “Professor João Costa”, em Aracaju, Sergipe, se convertido em moeda atual, este montante de 118 milhões de contos de reis corresponderia a R$ 14. 514.000,00 (catorze milhões e quinhentos e catorze mil reais), ou seja, uma bagatela, em termos patrimoniais, para uma capital provincial, mesmo para uma de pequeno porte como São Cristóvão. Assim, o argumento de perda material de seus bens públicos não se sustenta como justificativa impeditiva para a mudança da capital. Continua o autor... Suponha-se mesmo que se perdessem esses edifícios, esses contos de réis; - seria isso uma razão suficiente para conservar-se a província assentada para seu desenvolvimento de progresso, quando todas as outras se levantam e marcham apressadas acompanhando o movimento geral? Não será mui mesquinho semelhante argumento, indigno de nós e mui deponente contra nosso bom senso? Mas tais edifícios jamais se devem considerar perdidos. A câmara municipal deixará uma imprópria casa térrea alagada, e passará a fazer suas sessões e as do júri num belo edifício, qual o do palácio do governo. A casa do mercado continuará a servir para o mesmo fim; - e quando não servisse melhormente - deverá ser aproveitada para uma casa penitenciaria, reunindo para esse fim todas as condições –. A casa da tipografia[ i ] e armazém de artigos bélicos, por insignificantes, não merecem menção... Atendam por tanto aqueles que condenam a mudança da capital ao que talvez se lhes pergunte: Nesta capital de Sergipe, onde funcionava a assembleia provincial? Em um salão do convento de São Francisco! A Biblioteca pública? Em outro salão desse edifício. A Tesouraria geral? Em outro salão ali mesmo no convento! A Tesouraria provincial, n'um corredor térreo do tal convento! O Correio geral? Num miserável cubículo térreo, ainda desse mesmo convento! O Liceu? Num salão do convento do Carmo! O leitor há de perceber que o Convento do Carmo , ao que tudo indica, funcionava como se fosse um mal-arranjado centro administrativo da antiga Capital ; tal observação se faz pertinente porque revela, em parte, a preocupação do autor em mostrar a completa precariedade patrimonial da Província . Dito de outra forma, São Cristóvão nada tem a perder em razão mesmo de nada possuir em termos de bens imóveis provinciais. Segue o texto... Se não temos, há tanto tempo que possuímos os foros de capital, edifício próprio para a nossa câmara municipal, quando Laranjeiras, Estância e até mui pequenas municipalidades da província o possuem; - se não possuímos um único edifício próprio em que funcionem nossas repartições públicas, que razão nos assiste para deplorar e maldizer uma mudança que em breve nos fará sair desse estado de atraso a que vivíamos condenados pela força de um mau fado? Pois achamos hoje o bem e repelimo-lo? Bem se diz que os povos são as vezes como crianças, que choram pelo bem que se lhes faz quando entendem que se lhes contraria. O argumento, pois, dos edifícios cai absolutamente por terra em face de tais considerações. A esta altura do texto, nosso colunista começa a apresentar e a refutar o segundo argumento, “a ruína do comércio”, tratando-o como “infundada asserção”. Diz ele: A ruína do comércio. Como se quer justificar esta infundada asserção? Dizendo-se: Deitamo-nos felizes, e amanhecemos desgraçados! Perdemos em um dia tudo que ganhamos em anos! Os meios únicos que tínhamos para nosso alento, tiram-nos; ficamos baldos[ 2 ] de outros! Sem empregados públicos, sem a força de linha [ 3 ] e policial, está morto nosso comércio; aniquiladas nossas transações - Falsos ou verdadeiros estes argumentos, os que tomam em guarda de sua causa, perdem-na tristissimamente, e dão a justificabilidade à medida da mudança da capital. [ 4 ] Se falsos, é claro que a nossa existência comercial, não estando dependente dessa existência de empregados e soldados em Sergipe, pode continuar a existir e a prosperar. Um povo não morre por tão pouco. Se verdadeiros, não são aqueles mesmos que se servem de tais argumentos que lucidamente demonstram que uma cidade que só tem comércio porque nela há empregados públicos e soldados não pode ser a capital de uma província? Aqui cabe uma reflexão, advinda de uma inferência, de uma suposição, plausível em razão das teorias economicistas de então, ainda hoje em voga, que apontam o fator econômico como uma das principais causas a condicionar a transferência da Capital são-cristovense para Aracaju. Conforme deixa entrever o texto do Justus, corre à boca miúda entre os moradores da Província à época, sobretudo em meio à classe de funcionários públicos, pequenos comerciantes e modestos empresários da antiga cidade, que uma capital deve ser muito mais do que um lar para modestos funcionários público-administrativos que, diuturnamente, sustentam a economia local, composta basicamente de pequenos comerciantes. O argumento de ter sito o quesito economia (agrícola?) um fator decisivo para a mudança da capital, parece aqui ganhar corpo. De acordo com esse critério, para além de uma clientela específica (funcionários públicos), a existência de um centro administrativamente organizado, capaz de ordenar, concentrar e ecoar, de maneira satisfatória, o produto de uma economia, indústria, agricultura e comércio pungentes, que se mantêm constante em fluxo de mercadoria, bens, serviços e capital pecuniário, a serviço de uma expressiva classe consumidora, tanto interna quanto externa, de forte trânsito nacional e internacional, é mesmo um dos fatores determinantes para a manutenção do status de Capital a cidades de estados e países. Continuemos com a leitura do texto: Gostamos do argumentar por cifras: ainda a elas. A quanto montarão provavelmente esses ordenados dos empregados e soldos dos soldados, que, conservados no capital, formam a sua ventura, e retirados a sua desgraça? Empregados públicos gerais e provinciais valor máximo 30:000$ Força de linha 30:000$ Corpo policial 50:000$ Total 110:000$ Se a existência comercial de Sergipe não é animada pelo concurso da lavoura, única que pode sustentar e dar vida ao comércio; se seu alento está somente dependente desses 110:000$000 de ordenados e soldos, quem impede aos que a ele se dão de se irem estabelecer na região para onde fugiu essa alma de seu corpo, ali unir-se a ela? Recearão que esse seu animador espírito não entre em nova composição com esse mesmo corpo? Se não podeis subsistir sem os ordenados e soldos dos empregados e tropas, acompanhe-os, assim como ao exército que levanta o acampamento seguem os vivandeiros [ 5 ] após sua bagagem. Se, pelo contrário, esses ordenados e soldos não são o “sine qua non” [ 6 ] de nossa existência, então não vos queixeis; continue em vossos misteres. [ 7 ] [ 2 ] falho, vão, inútil [ 3 ] “Força de linha ”: expressão equivalente à “força policial”. Grifos nossos. [ 4 ] Trecho de difícil compreensão ; em outras palavras, o autor afirma que aqueles que “tomam (esses argumentos) em guarda (defesa) de sua causa” e os usam em seu benefício, acabam por colocá-la (a causa) em risco, perdendo-a “tristissimamente” por apresentar - ao contrário do que inicialmente se desejava - justificativas para a mudança da capital. [ 5 ]Vivandeiros , também conhecidos como vivandières, eram mulheres que acompanhavam exércitos e vendiam alimentos, bebidas e outros itens essenciais aos soldados. Elas desempenharam um papel crucial durante guerras e conflitos, fornecendo suporte logístico aos militares. Originado na França, o termo vivandière foi amplamente utilizado durante o século XIX para descrever essas mulheres. As vivandeiros eram conhecidas por sua coragem e resiliência, enfrentando condições adversas nas frentes de batalha para atender às necessidades dos soldados. Muitas vezes, elas se tornavam figuras reconhecíveis e respeitadas dentro das unidades militares. É interessante notar que o papel das vivandeiros variava ao longo da história e em diferentes culturas. Elas desempenharam um papel significativo em manter o moral das tropas e fornecer apoio prático durante tempos de guerra... [ 6 ] "Sine qua non" é uma expressão em latim que significa "sem a qual não". É usada para descrever aquilo que é essencial ou indispensável para a realização de algo. [ 7 ] Misteres é o plural de mister. O mesmo que: trabalhos, cargos, empregos, necessidades, ocupações, profissões, serviços. [ i ] Esta já está ocupada pela Mesa de Rendas Provinciais. Chegamos ao fim desta "Parte I". Caso tenham interesse em ler a segunda deste ensaio , manifestem-se aqui, deixando seus comentários logo mais abaixo. Isso muito contribuirá para nos motivar a seguir adiante. Ainda: se for de seus interesses publicarmos (em face mesmo da leitura um tanto quanto difícil dele, bastante comum quando se trata de publicações antigas) algum comentário mais pontual acerca do texto, também se manifestem aqui nesse sentido. Este é um trabalho ensaístico de natureza didática. Também aceitamos contribuições interpretativas que colaborem para o esclarecimento desta postagem. Entrem em contato. Obriago pela atenção, Prof. Heriberto de Souza.

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